quinta-feira, maio 31

Luci e Mauro.

"Quanto a escrever, mais vale um cachorro vivo." Clarice Lispector, in A Hora da estrela.

O que havia entre os dois era realmente um caso de amor, ele sempre entendia cada palavra que ela falava como se ela houvesse dito-as antes e nessa hora ele sentia que a conhecia de vidas passadas - dejá vu. Ele conseguia entender todos os defeitos de Luci e passaria por cima de todos estes pequenos detalhes, afinal, o que havia entre eles era realmente um caso de amor. Ela dava a ele bastante carinho, sempre quando ele chamava, e mesmo quando eles brigavam, ela ficava ali, bem perto dos pés de Mauro, algumas vezes ela até dormia e ficaria por horas daquele jeito, se ele quisesse.

Os problemas começavam na hora de ir dormir, no momento da separação, eles não mais dormiam juntos. Algumas vezes ele gemia tão estridentemente na sala que ela imaginaria um ferro sendo cravado fundo na garganta dele. Quando ele gemia, ela tinha medo. Tremia só de pensar que ele poderia estar ficando louco. Quando ela já não aguentava mais aquele som aterrorizante o pegava de jeito e dava uma bela surra. Minutos depois ele ficava calminho e dormia aos pés da cama. Uma surra para uma noite calma de sono. Mauro era adorável é louco, aquelhes olhos sempre pediam um pouco mais de carinho, por mais que fosse dado, submisso ele farejava em volta.

Um dia ela chegou em casa e encontrou tudo destruído, roupas rasgadas, objetos quebrados, sua caixa de lembranças de toda uma vida no chão, papéis espalhados pela sala. Aquilo era demais, ele estava destruindo a vida de Luci, destruindo aquela casa que ela mantinha com tanta organização, ela não poderia mais aguentar aquelas loucuras. Ele veio se aproximando com aqueles olhos, de quem acabou de cometer uma travessura e sabe que vai levar umas palmadas, com o rabinho entre as pernas, mas o olhar mudou e ele começou a babar e gemer. Mauro correu em direção a Luci, ela se encontrava acuada entre a parede e com medo, um medo que subiu pelo coluna vertebral. Antes que Mauro a tocasse, Luci correu para achar algo que lhe desse proteção. E Mauro se escondeu, como em uma brincadeira. Aquilo tinha passado dos limites! Ela foi até a sala, observando fotos espalhadas pelo corredor, toda aquela bagunça, e por um minuto repensou sua vida. Encontrou o animalzinho branco de focinho rosado, e apanhando um pedaço de pau bateu, bateu e bateu até que o bicho se tornasse um mingau de sangue e ossos partidos em pêlos claros onde boiavam um par de olhos abertos que não morriam.

Nenhum comentário: